(Claudia Lage Rebello da Motta, Flávia Maria Santoro, Walkir Alexandre Toscano de Brito)
Como sistemas podem apoiar o processo ensino-aprendizagem sugerindo materiais e pessoas?
Você certamente já recebeu alguma indicação de produto após fazer uma compra na Amazon, ou já notou que a Netflix procura identificar suas preferências a partir dos filmes e séries que você assiste. Ou quem sabe o próprio Facebook já lhe sugeriu novos amigos. Então você já conhece sistemas de recomendação. Mas o que talvez você não saiba é que, da mesma forma que sistemas lhe recomendam produtos, eles podem lhe auxiliar no processo de ensino-aprendizagem. Vamos descobrir como estes sistemas funcionam?
Objetivos Educacionais:
- Apresentar os conceitos básicos e as principais técnicas dos sistemas de recomendação;
- Discutir como estes sistemas podem ser usados para beneficiar o processo ensino-aprendizagem;
- Mostrar exemplos de sistemas de recomendação para educação.
Índice:
- 1 INTRODUÇÃO
- 2 FUNCIONAMENTO DOS SISTEMAS DE RECOMENDAÇÃO
- 3 TIPOS DE RECOMENDAÇÃO
- 4 O USO DE SISTEMAS DE RECOMENDAÇÃO EM AMBIENTE EDUCACIONAL
- 5 GEEKIE GAMES: UM EXEMPLO DE SISTEMA DE RECOMENDAÇÃO PARA EDUCAÇÃO
- 6 CONCLUSÕES
- Resumo
- Leituras Recomendadas
- Exercícios
- Referências
- Autoria
- Como citar este capítulo
- Comentários
1 INTRODUÇÃO
Os sistemas de recomendação já fazem parte do nosso dia a dia. Quando você faz uma compra em sites como Amazon, Saraiva ou Lojas Americanas, por exemplo, recebe sugestões de livros ou produtos relacionados ao que você está adquirindo ou está interessado. Quando você assiste filmes e séries na Netflix, seu perfil com suas escolhas vai sendo construído e aos poucos as sugestões se tornam mais precisas. O que está por trás dessas indicações é o que chamamos de “Sistemas de Recomendação”.
Os Sistemas de Recomendação começaram com a ideia do “boca a boca”. Imagine que você anda estudando muito, mas resolve dar uma volta para descansar. Tem pouco tempo para decidir qual filme assistir e, como tem estado muito ocupado, não tem ideia do que está passando nos cinemas. O que você faz? Bem, a maior parte das pessoas consulta algum amigo que tenha o mesmo gosto ou que confie no seu julgamento. Pronto! Resolvido.
A Netflix explica aos seus clientes as avaliações e recomendações!
Você pode classificar as sugestões de filmes e séries com os sinais de aprovação ou desaprovação. Além disso, temos um ótimo mecanismo integrado para sugerir só os conteúdos que achamos que despertarão o seu interesse com base em seu histórico de reprodução. Quanto mais você usar a Netflix, mais relevantes serão as sugestões.
A Netflix dá a você a opção de classificar filmes e séries já assistidos ou que foram recomendados para você com um sistema de aprovação (símbolo de “gostei”) e desaprovação (símbolo de “não gostei”). A porcentagem exibida ao lado de um título indica a nossa estimativa de probabilidade de você gostar dele.
Você também pode classificar os títulos na página de descrição dos filmes e séries. Também é possível rever os títulos que você já classificou clicando em Classificações na seção “Meu perfil”, em “Sua Conta”. As classificações que você fez usando nosso antigo sistema de classificação com estrelas estão armazenadas e ainda são usadas para personalizar sua experiência Netflix.
A classificação dos filmes e séries é uma maneira fácil de nos mostrar do que você gosta. Quanto mais títulos você classificar, melhores serão as sugestões que faremos para você.
Explicando de forma resumida, os Sistemas de Recomendação trabalham mais ou menos assim:
- Identificam pessoas que têm interesses em comum.
- Contabilizam as avaliações que essas pessoas fazem dos itens disponibilizados.
- Utilizam cálculos estatísticos para descobrir quem são os pares, ou seja, pessoas que gostam das mesmas coisas ou que tem gostos opostos.
- A partir dessas informações, recomendam itens para uma pessoa com base na avaliação de seus pares.
À medida que você dá um feedback para o sistema, dizendo se gostou ou não daquela recomendação, ele refaz os cálculos e ajustes necessários para aperfeiçoar as recomendações.
Os Sistemas de Recomendação são uma evolução dos chamados Sistemas de Filtragem Cooperativa. O sistema Tapestry, lançado em 1992, cunhou o termo Filtragem Cooperativa, enquanto que os autores Resnick e Varian (CACM, 1997) definiram os Sistemas de Recomendação, cujo processo chave é comparar usuários a fim de encontrar interesses similares (utilizando avaliações e anotações). Através da Figura 1 você pode acompanhar o histórico dos principais sistemas desenvolvidos. Já a Tabela 1 apresenta os tipos de itens recomendados pelos primeiros sistemas.
Diversos outros sistemas foram propostos desde então. Vamos estudar mais sobre como estes sistemas funcionam?
2 FUNCIONAMENTO DOS SISTEMAS DE RECOMENDAÇÃO
Os Sistemas de Recomendação são muito utilizados no comércio eletrônico pois, como se costuma dizer, os concorrentes estão a um “clique no mouse” de distância. Se a recomendação deixa o comprador feliz por ter entendido o que ele deseja, ele volta a comprar na mesma loja, ocorrendo assim a sua fidelização.
A Figura 2 ilustra um esquema geral de como funcionam os Sistemas de Recomendação. Existem alguns métodos de recomendação (implementados por algoritmos computacionais) que recebem tanto entradas dos usuários individualmente, quanto informações reunidas provenientes de todos os membros da comunidade que participam deste sistema. A partir destas informações, determinados métodos podem gerar sugestões, previsões, avaliações e revisões, que são apresentadas ao usuário como recomendações. O usuário, por sua vez, deve enviar um feedback ao sistema sobre a recomendação recebida, para que os resultados possam ser aprimorados continuamente.
As entradas do usuário-alvo permitem que o sistema ofereça recomendações personalizadas. Os sistemas respondem ao usuário de acordo com seu estado atual através de informação obtidas com a navegação do mesmo. Portanto, as informações sobre navegação implícita e navegação explícita são importantes entradas para o sistema. Na navegação explícita, o usuário fornece informações sobre suas preferências a fim de refinar as recomendações (entrada intencional), enquanto na navegação implícita, o sistema captura as páginas acessadas pelo usuário. As entradas da comunidade incluem um grande volume de informação que representam como vários indivíduos dessa comunidade, ou a comunidade como um todo, percebem os itens.
As recomendações sobre itens variam de acordo com o tipo, quantidade e a apresentação das informações fornecidas pelo usuário. Existem três principais tipos de saída nos Sistemas de Recomendação: Sugestão, Previsão e Avaliação.
Além disso, como a Figura 2 ilustra, a entrega das recomendações pelo sistema pode ser de 3 tipos:
- Passiva – exibe as recomendações no contexto da aplicação. Este tipo de entrega apresenta a desvantagem de que as recomendações podem passar desapercebidas. Um exemplo desse tipo de entrega são aquelas mensagens que aparecem enquanto você está navegando no site de compras, como “os mais vendidos” ou “clientes que compram tal livro compram também tais livros”.
- Pull – permite que os usuários controlem quando suas recomendações serão exibidas. O sistema apenas avisa que existem recomendações disponíveis, mas estas só serão exibidas quando o usuário requisitar. Este tipo de entrega está associado aos sistemas nos quais é preciso logar para poder interagir. O sistema processa o seu perfil pelas suas escolhas enquanto você navega e guarda as recomendações para quando você quiser consultá-las.
- Push – envia recomendações para o usuário mesmo quando este não está interagindo com o sistema. A maneira mais comum de implementar este método é através do envio de emails contendo recomendações. Neste caso, o sistema também é persistente e armazena o seu perfil. Sempre que encontra algo que possa te interessar, ele envia a recomendação por email para você.
Existem vários métodos de recomendação usados nos sistemas atuais, alguns desses sistemas combinam duas ou mais técnicas:
- Método de Extração Bruto: oferece aos usuários uma interface de busca onde o usuário pode pesquisar na base de dados por informações e receber como “recomendação” as informações retornadas pela pesquisa. Embora este método não seja tecnicamente um método de recomendação, aos usuários parece ser.
- Seleção Manual: conta com a interferência humana, pois especialistas sobre cada assunto avaliam os itens para que estes possam ser recomendados. Esses especialistas avaliam os itens com base no seu gosto pessoal, nos seus interesses e objetivos a fim de criarem listas de itens recomendados aos membros da comunidade.
- Resumo Estatístico: é usado quando não é necessário (ou não é possível) personalizar as recomendações. Este método recomenda os itens de acordo com sua popularidade entre os membros da comunidade ou com a média ou resumo das avaliações. Apesar desse método oferecer recomendações não personalizadas, ele é muito popular pois é facilmente computado.
- Método baseado em Atributos: usa as propriedades dos itens e os interesses dos usuários para fazer as recomendações. Por exemplo: um usuário que está pesquisando documentos sobre e-commerce e leu um documento sobre Sistemas de Recomendação pode receber como sugestão a leitura de um documento sobre Sistemas de Recomendação em sites de Comércio Eletrônico.
- Correlação Item a Item: identifica produtos que são frequentemente relacionados àqueles que o usuário demonstrou interesse. Os sistemas normalmente utilizam itens pelos quais o usuário demonstra interesse no momento para criar as correlações, ao invés de inspecionar seu histórico.
- Correlação Usuário a Usuário: recomenda itens baseado na correlação entre um usuário e outros usuários que se interessam pelo mesmo item. Também é chamado de “filtragem colaborativa” porque se originou na técnica de filtragem de informação que usa a opinião de grupos para recomendar itens.
Os Sistemas de Recomendação também podem ser classificados de acordo o grau de personalização que oferecem aos usuários, que podem ser: não personalizado; personalizado efêmero; e personalizado persistente (e persistente com ajustes).
Os sistemas não-personalizados recomendam os mesmos itens para todos os usuários. Essas recomendações podem ser baseadas nos métodos: seleção manual, resumo estatístico, etc. Exemplo: Lista dos mais vendidos, Promoções e Lançamentos nos sites de e-commerce.
Os sistemas efêmeros usam informações da seção corrente do usuário para gerar suas recomendações. As recomendações normalmente são baseadas na navegação do usuário e nos itens que este selecionou. Os métodos mais usados são: correlação item a item e recomendação baseada em atributo. Exemplo: títulos do mesmo autor.
Os sistemas persistentes podem criar recomendações diferentes para diferentes usuários, mesmo que estes estejam visualizando o mesmo item. Para isso os sistemas usam informações armazenadas (persistentes) sobre as preferências dos usuários e os seguintes métodos: correlação item a item, recomendação baseada em atributo e correlação usuário a usuário. Exemplo: Site da Amazon.com – identifica o cliente e recomenda baseando-se em informações do mesmo.
CINECLUBE: Minority Report (2002)
3 TIPOS DE RECOMENDAÇÃO
Os sistemas de recomendação são basicamente de três tipos, explicados a seguir.
3.1 Sistemas Baseados em Conteúdo
Um sistema de recomendação baseado em conteúdo recomenda itens ao usuário que sejam semelhantes ao que ele escolheu no passado. A recomendação é feita a partir de marcação de itens. Itens com características próximas destas marcações são recomendados. Por exemplo, em um cenário de recomendação de Objetos de Aprendizagem, um usuário que escolheu e gostou do objeto “O caso do rebanho de Jacó” (disponível no repositório RIVED), receberia recomendações do assunto Genética.
As vantagens deste tipo de sistema é que são simples para dados textuais e não necessitam de muitas informações sobre um usuário para começar a sugerir itens.
3.2 Sistemas Baseados em Filtragem Colaborativa
A técnica de filtragem colaborativa consiste na recomendação de itens que pessoas com gosto semelhante preferiram no passado, partindo da regra genérica: “Se um usuário gostou de A e de B, um outro usuário que gostou de A também pode gostar de B”. Esse tipo de recomendação evita o problema de recomendações repetitivas, porém uma desvantagem é que requer grande número de informações sobre o usuário e sua vizinhança para funcionar bem. Este tipo de sistema ainda se divide em técnica Baseada no Usuário e Baseada no Modelo.
A técnica Baseada no Usuário se fundamenta na ideia de que uma pessoa pertence a um grupo de indivíduos com interesses similares e como resultado, itens avaliados pelos indivíduos podem ser utilizados como base para recomendar itens.
A técnica Baseada no Modelo analisa informações do histórico e perfil do usuário para identificar relações entre um item e outros itens da comunidade. Por exemplo, a compra de um item pode estar relacionada à compra de outro item (ou vários itens), e então essas relações lógicas são utilizadas para criar as regras para recomendação.
3.3 Sistemas Híbridos
Um sistema híbrido consiste em combinar as duas abordagens anteriores, tentando maximizar suas vantagens e superar suas desvantagens.
Como funciona o famoso algoritmo do Spotify?
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4 O USO DE SISTEMAS DE RECOMENDAÇÃO EM AMBIENTE EDUCACIONAL
É possível usar os Sistemas de Recomendação aplicados na Educação? Sim! Há muitas aplicações nessa área que podem facilitar tanto a vida dos professores, como a dos estudantes!
Iniciativas que aliam Sistemas de Recomendação na Educação são estratégias a serem utilizadas para modificar a relação dos estudantes com os conteúdos exigidos no ensino regular, bem como as habilidades e competências envolvidas, de modo que o processo de ensino-aprendizagem se torne mais significativo, tanto para os discentes, quanto para os docentes. A Figura 3 ilustra uma situação em que usuários (alunos e professores) podem se beneficiar da recomendação de artigos científicos através de um sistema de recomendação acadêmico que “conhece” seus perfis.
Vamos ver agora alguns exemplos de tipos de recomendação que vêm sendo estudados nas pesquisas na área.
4.1 ActivUFRJ
O ActivUFRJ é um ambiente colaborativo de trabalho integrado e virtual, que tem como objetivo promover a interação entre docentes, pesquisadores e alunos na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Os usuários identificam-se através de suas habilidades, experiências, interesses e produção acadêmica. A partir desses dados, uma das características mais importantes do ActivUFRJ é sua capacidade de recomendar. Após o usuário fazer um cadastro mais completo será gerado um gráfico de habilidades que ajudará na coleta de informações para as recomendações (Figura 4).
O ActivUFRJ recomenda (i) pessoas: usuários com habilidades em comum e usuários com tags em comum, e (ii) oportunidades: eventos, bolsas, estágios, concursos, empregos, cursos, etc. A Figura 5 ilustra a interface através da qual um usuário conhece as recomendações que o sistema disponibiliza para ele.
Além dessas recomendações básicas, outras funcionalidades de suporte a professores e alunos também estão sendo propostas.
4.2 Sistema de Recomendação de Materiais Didáticos
Na área acadêmica, observamos a dificuldade dos alunos para conseguir materiais didáticos, as dificuldades para resolver exercícios, escolher os livros mais relevantes, ou assistir os vídeos mais pertinentes. O objetivo deste sistema é apresentar recomendação de materiais didáticos desenvolvidos por docentes para outros docentes e alunos através da plataforma ActivUFRJ. O sistema proposto, ainda em fase de implementação, utilizará um modelo de recomendação híbrido, seguindo os seguintes passos: Interação do usuário na plataforma; Coleta de informações; Filtragem das informações; Sugestões de recomendações; Avaliações das recomendações feitas pelos usuários.
4.3 Portal da Robótica Escolar: Uma Proposta para Recomendação de Atividades Tecnológicas para Escolares
Nesta proposta, a ideia é apoiar professores interessados no desenvolvimento de atividades que envolvam a montagem de aparatos robóticos e o ensino de programação como ferramenta para abordagem dos mais variados conteúdos escolares na superação de desafios propostos e efetiva atuação como protagonista da aprendizagem baseada em projeto. O portal funciona como um sistema de recomendação de atividades padrão que são previamente cadastradas pelos usuários a partir de informações coletadas e armazenadas, tais como: (i) mais positivadas: recomendação das atividades melhor avaliadas por todos os usuários; (ii) mais recentes: recomendação das mais recentes atividades postadas por todos os usuários; (iii) por conteúdo: recomendação das atividades de conteúdos mais próximos aos apontados pelo usuário ao efetuar o cadastro; (iv) por conhecimento: recomendação das atividades de conteúdos mais próximos aos melhores avaliados pelo usuário; (v) por usuário: recomendação das atividades melhor avaliadas por outros usuários que positivaram alguma atividade em comum.
4.4 Sistema de Recomendação de Jogos para o Ensino da Matemática
O ensino de matemática na educação regular brasileira apresenta indicadores historicamente negativos do nível de aprendizagem atingido pelos alunos egressos do ensino fundamental e médio. O problema da ausência de competência matemática e capacidade de desenvolvimento do raciocínio lógico implica em um déficit de profissionais formados em áreas diretamente ligadas ao emprego de habilidades matemáticas e outras ciências exatas. Estudos apontam que apenas 11% dos alunos brasileiros sabem matemática ao sair do ensino médio (PISA, 2011).
Neste contexto, jogos educacionais podem funcionar como instrumentos pedagógicos auxiliadores no processo de ensino-aprendizagem da Matemática e servir como ferramentas e estratégias que proporcionam o desenvolvimento dessas competências, promovendo assim um novo enfoque sobre o ensino da Matemática.
Este Sistema de Recomendação indica jogos em forma de desafios que levam em consideração os interesses e necessidades pedagógicas de cada aluno com o propósito de empregá-los no reconhecimento de suas habilidades e competências. O sistema é baseado em uma análise diagnóstica de identificação da proficiência de habilidades matemáticas requeridas por diferentes áreas (Álgebra, Geometria, Aritmética).
O sistema foi aplicado na seleção de jogos no ensino aprendizagem da matemática para alunos do 1º ano do ensino médio da Rede VespeR de ensino, baseado na análise diagnóstica e na teoria de resposta ao item. A análise diagnóstica foi aplicada em duas escolas particulares da mesma rede de ensino, no Estado de São Paulo, no mês de outubro de 2013. Participaram desse estudo 53 alunos, com idades entre 14 e 15 anos, sendo 50% do sexo masculino e 50% do sexo feminino, todos do período diurno da primeira série do Ensino Médio. A duração da análise diagnóstica foi de, em média, 50 minutos e utilizou-se o sistema de recomendação na aplicação dos jogos aos participantes.
Os resultados aferidos na aplicação do estudo foram dispostos conforme o grau de dificuldade em uma régua de resultados baseada na teoria de resposta ao item (TRI). Foram classificados nessa escala numérica os alunos conforme sua proficiência e raciocínio matemático lógico constatado. De posse dos resultados da análise diagnóstica e da respectiva régua dos resultados, foram recomendados jogos específicos para cada aluno, de acordo com seus interesses, particularidades, necessidades e dificuldades pedagógicas apresentadas. Os jogos recomendados especificamente a cada aluno foram oferecidos no período de duas semanas utilizando-se o sistema de recomendação.
Com o sistema de recomendação de jogos, foi possível constatar mudanças significativas no desenvolvimento do raciocínio lógico matemático dos alunos participantes, na produção e apropriação dos conhecimentos matemáticos básicos e dos conteúdos oferecidos, além de apreensão de novas habilidades e competências na resolução de situações problemas. Na primeira etapa do estudo foi de extrema importância aplicar a análise diagnostica para a calibração do grau do índice de dificuldade das questões, formando um banco de dados, e equalização das escalas na composição da régua de resultado, instrumento imprescindível na comparação dos resultados e permitindo sua utilização e comparação na segunda etapa.
A identificação afetiva do aluno com os jogos constituiu fator relevante para o sucesso no processo e consequente produção e apropriação de conteúdos básicos da matemática. Os alunos que se identificaram com o uso dos jogos recomendados apresentaram maior desenvolvimento nas suas habilidades, competências e no raciocínio lógico matemático. Foi constatado que houve uma significativa melhora em seus desempenhos referentes aos temas testados, diversificando assim as possibilidades de resolução dos problemas propostos da aprendizagem de conceitos matemáticos de uma forma lúdica, atraente e abrangente.
Concluímos (Brito, 2014) ainda que os alunos que apresentaram maior pré-disposição na aceitação dessa proposta metodológica de ensino-aprendizagem, através da recomendação do uso de jogos na resolução de situações-problema, demonstraram também melhores resultados, sendo capazes de validar estratégias e resultados, além de desenvolver novas formas de raciocínio e processos que implicam em um aumento do raciocínio lógico-matemático: raciocínio indutivo, dedutivo, analogia e estimativas, referentes às utilizações de conceitos e procedimentos matemáticos necessários em seu dia a dia.
DEBATE: Quais são as vantagens e desvantagens de Sistemas de Recomendação para a Educação?
Você já viu que existem diversas possibilidades do uso de sistemas de recomendação. Discuta com seus colegas sobre as vantagens e desvantagens que podem trazer!
5 GEEKIE GAMES: UM EXEMPLO DE SISTEMA DE RECOMENDAÇÃO PARA EDUCAÇÃO
O Geekie Games é talvez uma das plataformas mais “famosas” atualmente no Brasil. Ela é voltada para o grande Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e também para os vestibulares em geral, incluindo uma série de funcionalidades, tais como testes, plano de estudos e um grande simulado final.
No início de cada ano, começa o planejamento dos estudantes que irão prestar o ENEM ou algum vestibular. O que estudar, onde estudar e quais as melhores estratégias para conquistar sua vaga na universidade são as principais dúvidas dos estudantes. Estudar sozinho ou com amigos para uma prova ou para o ENEM não é uma tarefa fácil, e se torna ainda mais difícil sem uma orientação de qual conteúdo estudar. Saber qual sequência de estudo para cada matéria, perceber quais são os pontos fortes e fracos, montar um plano de estudo individual para obter uma boa colocação no exame, poder testar suas habilidades e competências em um simulado, etc.
Para auxiliar esses vestibulandos e pensando justamente no estudante que sente falta de apoio na hora de estudar, a Geekie, uma startup de tecnologia aplicada à educação, criou a Geekie Games, que faz um plano individual de estudos considerando os pontos fortes e fracos do candidato. Lançada em 2013 pela Geekie, a plataforma já foi utilizada por 2 milhões de estudantes em todo o país no ano de lançamento, e vem aumentando o número de adeptos ano após ano devido ao sucesso de suas recomendações em relação às matérias que devem ser estudadas para a realização do exame.
O desempenho dos estudantes que utilizaram o Geekie Games tem sido tão bom que o Ministério da Educação (MEC) o reconheceu como uma boa ferramenta de estudos para o exame, e Secretarias da Educação de 19 Estados, entre eles Bahia, Santa Catarina, Paraná, Pernambuco, Ceará, decidiram oferecer o programa aos seus estudantes.
A plataforma foi adotada por redes estaduais de Educação porque possibilita que professores e gestores acompanhem, em tempo real e também de forma gratuita, o desempenho e a evolução dos estudantes. Com uma expectativa de alcançar 3,7 milhões de usuários em todo o Brasil, o objetivo principal é não apenas atrair os estudantes, mas mantê-los motivados a estudar. Além disso, professores podem intervir no processo, sugerindo conteúdos e atividades a todo o momento e auxiliar o sucesso do plano de estudo de cada estudante. Os resultados mostraram que, quanto mais os estudantes estudaram as recomendações oferecidas pela plataforma, melhor eles foram no simulado final.
O processo de utilização é bastante simples. Na primeira etapa, o estudante faz um teste para avaliar seus conhecimentos do conteúdo do ENEM e identificar seus pontos fortes e fracos. A avaliação é dividida de acordo com as quatro áreas do ENEM: ciências da natureza, ciências humanas, matemática e linguagens. A prova pode ser feita em qualquer dia e horário de acordo com as possibilidades dos estudantes. Não é obrigatório responder às questões de todas as quatro disciplinas, mas o ideal é que o estudante possa medir todo o seu conhecimento das áreas exigidas no ENEM.
Com base no resultado deste teste, o sistema sugere um plano personalizado de estudos. Cada etapa do processo é analisada e à medida que o estudante avança em seus conteúdos, recomendações de exercícios são disponibilizadas de acordo com suas necessidades.
Todas as questões usadas no simulado utilizam o mesmo método de avaliação do ENEM, a Teoria de Resposta ao Item (TRI), que atribui pesos diferentes para as questões de acordo com o seu grau de dificuldade. A teoria possui modelos dependendo da natureza das questões. Por exemplo, existem questões consideradas fáceis, intermediárias e outras difíceis, nas quais o acerto depende de um maior domínio do conteúdo, exigindo assim uma maior habilidade e competência em relação a esse conteúdo. O sistema analisa os casos em que o estudante errou questões fáceis e intermediarias e acertou questões difíceis, de acordo com as competências requeridas a fim de detectar possíveis acertos ao acaso (“chutes”), o que não implicará no descarte desse tipo de acerto no computo de sua nota final.
Na segunda etapa, o estudante recebe um plano de estudos destacando seus pontos fortes e fracos que merecem maior atenção. A TRI qualifica o item de acordo com três parâmetros: o poder de discriminação, que é a capacidade de um item distinguir os estudantes que têm a proficiência requisitada daqueles quem não a têm; o grau de dificuldade da questão; e a possibilidade de acerto ao acaso (chute). Com isso será possível ao estudante comparar sua nota com a nota de corte dos cursos e faculdades de sua escolha, além de saber que conteúdos priorizar para atingir seus objetivos.
A plataforma permite ainda que professores, escolas e secretarias de educação tenham acesso ao desempenho dos seus estudantes e possam entender suas principais dificuldades. Um ranking atualizado diariamente permite mostrar o desempenho dos estudantes por área de conhecimento e assim direcionar as recomendações necessárias a cada etapa do processo de aprendizagem. Na plataforma, o estudante tem acesso a textos e vídeos sobre o conteúdo abordado nas provas. Durante esse período, o professor e a escola podem acompanhar a evolução e desenvolvimento dos seus estudantes e ajudá-los a se preparar melhor para o Enem.
ATIVIDADE: Reflita sobre estes exemplos!
Agora que você já estudou um pouco mais, podemos conversar sobre aplicações na área de Educação que já foram desenvolvidas. Algumas delas foram só propostas apresentadas em conferências científicas, mas muitas já estão se tornando produtos e podem ser encontradas na web.
Então, faça uma pesquisa: Que outros sistemas de recomendação você acha que podem ser úteis no contexto educacional? Tem alguma ideia? Pense um pouco. Como eles poderiam facilitar sua vida de estudante?
6 CONCLUSÕES
Os sistemas de recomendação estão cada vez mais presentes no nosso cotidiano. Não poderia ser diferente na Educação! Devemos cada vez mais nos apropriar dos resultados possíveis com esses sistemas para criar ambientes de ensino-aprendizagem ricos e que sejam capazes de ter um olhar para o indivíduo e apoiá-lo de acordo com suas necessidades.
Algumas tendências para aperfeiçoar os Sistemas de Recomendação podem ser observadas. Por exemplo, realizar o agrupamento de usuários por gostos similares, assim, a similaridade pode ser calculada entre os usuários do grupo ao invés de compará-lo com todos os usuários do sistema; aplicação de técnicas avançadas de Aprendizagem de Máquina e Deep Learning além da Análise de Sentimento; combinação de outros aspectos, além dos tradicionais relacionados aos itens e ao próprio usuário; integração entre diversas plataformas, tais como as redes sociais; melhoria na experiência do usuário, impedindo a monotonia e previsibilidade do sistema, com diversidade nos resultados apresentados.
RESUMO
Neste capítulo foi abordado o conceito geral de Sistemas de Recomendação, seu histórico e funcionamento básico. De acordo com os objetivos pretendidos, apresentamos algumas técnicas comumente utilizadas por estes sistemas, tais como: Método de Extração Bruto; Seleção Manual; Resumo Estatístico; Método baseado em Atributos; Correlação Item a item; e Correlação usuário a usuário ou Filtragem colaborativa. Discutimos o uso destes sistemas no ambiente educacional, por exemplo, na recomendação de itens para o estudante e professor (os objetos de aprendizagem), guia para acesso a conteúdo e materiais de acordo com as características e perfis dos alunos. Por fim, exemplificamos com o Geekie Games, uma plataforma que vem sendo amplamente utilizada na prática por muitos estudantes.
A Figura 6 apresenta um Mapa Mental contendo o resumo e relações dos tópicos abordados no capítulo. Você pode concluir seus estudos elaborando, ou complementado, este mapa mental!
Leituras Recomendadas
Exercícios
- Para cada aluno cadastrado em uma plataforma educacional, temos um conjunto de objetos de aprendizagem que ele acessou e avaliou. O Sistema de Recomendação está programado para recomendar objetos de aprendizagem cujas características são similares às dos objetos de aprendizagem utilizadas e bem avaliadas pelo aluno em questão. Que outras recomendações o sistema poderia fazer? Pense e proponha novas maneiras de recomendar objetos de aprendizagem para cada aluno, utilizando outros tipos de informação que poderiam ser disponibilizadas na plataforma.
- Imagine uma plataforma educacional onde todos os professores, alunos e pesquisadores da universidade estão cadastrados. Cada um preencheu seu perfil com suas áreas de interesse e especialidades que estuda e tem formação. Você e sua equipe são responsáveis por criar um sistema de recomendação utilizando essas informações. Quem pode ser seus usuários? O que você recomendaria? Para quem recomendaria? Quais seriam as variáveis consideradas em seu sistema? Que método de recomendação escolheria? E como utilizaria o feedback do usuário?
- Você foi escolhido como monitor da disciplina de Sistemas de Recomendação voltados para apoiar a Educação. Logo na primeira aula, o professor pede para você apresentar aos estudantes os conceitos básicos de sistemas de recomendação. E agora? Prepare uma apresentação com os conceitos básicos para expor para seus colegas! É ensinando que se aprende. Vamos lá!
Referências
AGARWAL, D.K.; Chen; Bee-Chung. Statistical Methods for Recommender Systems. Cambridge University Press, 2016.
BRITO, W. A. T. Modelo de Recomendação de Objetos de Aprendizagem Baseado em Seleção de Conteúdo no Ensino da Matemática. Dissertação de Mestrado. PPGI/UFRJ, 2014.
KARIMI, M., JANNACH, D.; JUGOVAC, M. News recommender systems – Survey and roads ahead. Vol. 54, Issue 6, Pages 1203-1227. In: Information Processing & Management. Elsevier: Nov. 2018.
RESNICK, P.; VARIAN, H. R. Recommender Systems. v. 40, n. 3, p. 55-58. In: Communications of the ACM. New York, USA, Mar. 1997.
RICCI, F.; ROKACH, L.; SHAPIRA, B.; Kantor, P.B. Recommender Systems Handbook. Springer, New York, 2015.
SCHAFER, J. B.; KONSTAN, J. A.; RIEDL, J. E-Commerce Recommendation Applications, Data Mining and Knowledge Discovery. 5, 115–153. Kluwer Academic Publishers. Manufactured in The Netherlands, 2001.
Autoria
(http://lattes.cnpq.br/0774464575739440)
Analista de Tecnologia da Informação do Instituto Tércio Pacitti de Aplicações e Pesquisas Computacionais da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil. Ela é Doutora e Mestra em Engenharia de Sistemas e Computação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (COPPE-UFRJ), e Bacharel em Informática pelo Instituto de Matemática da UFRJ. Sua pesquisa se concentra em Informática na Educação, especialmente nos seguintes temas: Inteligência Coletiva, Sistemas de Recomendação, Aprendizagem Colaborativa Apoiada por Computador e Neuropedagogia Computacional. Participa de projetos de pesquisa, e tem experiência na organização de workshops e conferências. Participou da diretoria da Sociedade Brasileira de Computação como diretora de planejamento e projetos estratégicos por três mandatos.
(http://lattes.cnpq.br/5377746284077362)
Pós-doutoranda na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Brasil. Ela é Doutora e Mestra em Engenharia de Sistemas e Computação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (COPPE-UFRJ), e Bacharel em Engenharia Eletrônica pela Escola Politécnica da UFRJ. Sua pesquisa se concentra em Sistemas de Informação, especialmente nos seguintes temas: Gestão de Processos de Negócios, Gestão do Conhecimento, Trabalho Cooperativo Apoiado por Computador e Aprendizagem Colaborativa Apoiada por Computador. Participa de projetos de pesquisa em nível internacional, e tem experiência na organização de workshops e conferências. Atuou na Universidade Pierre et Marie Curie – Paris VI, França (2004-2005) e Queensland University of Technology (QUT), Austrália (2012-2013) em projetos de pós-doc.
(http://lattes.cnpq.br/4013143135311718)
Doutorando em Informática em Sistema Complexos Adaptativos na Universidade Federal do Rio de Janeiro, Mestre em Informática pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2014), MBA em Marketing pela COPPEAD/UFRJ (2000) e graduação em Estatística pela Escola Nacional de Ciências Estatística – ENCE. Tem experiência na área de Docência em Estatística, Informática e nas áreas de Gestão, Administração e Comunicação, com ênfase em Marketing Digital, Métricas, Analytics e Big Data, atuando principalmente nos seguintes temas: Estatística e cientista de dados, planejamento de marketing e comunicação, análise e pesquisa de mercado, Inovação Social, métodos quantitativos, inteligência artificial, Segurança Pública e comportamento do consumidor.
Como citar este capítulo
MOTTA, Claudia Lage Rebello; SANTORO, Flávia Maria; BRITO, Walkir Alexandre Toscano. Sistemas de Recomendação para Educação. In: SAMPAIO, Fábio F.; PIMENTEL, Mariano; SANTOS, Edméa (Org.). Informática na Educação: games, inteligência artificial, realidade virtual/aumentada e computação ubíqua . Porto Alegre: Sociedade Brasileira de Computação, 2021. (Série Informática na Educação CEIE-SBC, v.7) Disponível em: <https://ceie.sbc.org.br/livrodidatico/sistemas-recomendacao>